sexta-feira, 8 de outubro de 2021

[Matéria] Astro City no Brasil Será Mais Uma Série Incompleta?

Rodrigo Rosas Campos

    Astro City é a série autoral de super-heróis com textos de Kurt Busiek, concepção visual e arte das capas de Alex Ross e a arte interna de Brent Anderson. Em Astro City há heróis representantes de todas as tendências e de todas as eras dos quadrinhos. Aqui no Brasil, a série passou por quatro editoras e os editores daqui nunca acertaram a mão com ela.

    Mas vamos ao contexto: aqui, a editora Abril publicou Marvels. Com o sucesso de Marvels, muito mais pela arte de Alex Ross, o Reino do Amanhã da DC foi publicado pela mesma editora pouco depois. E isso foi antes de Astro City ser publicada no Brasil. Entretanto, originalmente, Astro City saiu nos EUA entre Marvels e O Reino do Amanhã. Isso fez toda a diferença na recepção da série por aqui.

    O pouco sucesso de Astro City no Brasil se deveu ao nome de Alex Ross, mas, nessa série, ele só fez as capas e as concepções visuais dos personagens que apareceriam nas capas. Assim, muitos leitores brasileiros se ressentiram ao não ver suas pinturas em aquarelas foto realistas no interior das revistas. Nenhuma das editoras nacionais que trouxeram Astro City ao Brasil teve o cuidado de divulgar a proposta original da série, em que as ideias são predominantemente do escritor Kurt Busiek. A sensação de traição que o leitor brasileiro sentiu ao não ver a arte de Ross no interior das edições foi quase inevitável. Nos EUA, todos sabiam que Ross faria a concepção visual dos personagens e as capas, somente. Mais precisamente, Ross faria a concepção visual dos personagens que apareceriam nas capas. Mas vamos por partes.


    A primeira editora brasileira a trazer esse material foi a Pandora Books de 2002 até 2005. A segunda foi a Devir em 2006, que publicou dois encadernados. A terceira foi a Pixel Media, de 2007 até 2009, republicando muita coisa em mais de um especial e terminando por colocar Astro City num mix mensal sob o título Fábulas, que só durou quatro edições. Depois disso, Astro City ficou sem publicação no Brasil entre 2010 e 2014.

    A quarta editora foi a Panini, que assumiu a série de 2015 até 2019. Além de já ter republicado todo o material anteriormente publicado pelas demais. Ela foi a editora no Brasil que mais publicou Astro City com 12 volumes da série de encadernados, interrompendo a saga maior do Homem Quebrado, que fica incompleta, apesar de não afetar a sensação de conclusão dos volumes publicados. Busiek sabe escrever sem que o leitor se sinta no dever de assinar contratos vitalícios, isso é raro.

    Lá fora, a série primeiro foi publicada pela Image que se fragmentou, ficando com a Ws. Esta foi comprada pela DC, mas manteve o selo. A compra da Ws pela DC foi a verdadeira troca de editora, pois, quando os personagens de Jim Lee foram para o universo DC e o selo Ws acabou, Astro City foi transferida para o selo Vertigo, que era um selo que pertencia a DC. Lembrando que a DC/Vertigo não é proprietária nem de Astro City, nem de Vampiro Americano, nem de Y, o Último Homem, nem de Fábulas etc. Entretanto, a Vertigo (o selo Vertigo), hoje, acabou.

    O selo que substitui a Vertigo só publica (ou republica) a parte da Vertigo que é propriedade intelectual da DC, o que não é o caso de Astro City, que é de seus 3 autores. E como está Astro City lá fora hoje? Não sei. O que sei é que, originalmente, Astro City tem 17 volumes encadernados, aqui só vieram 12, e ainda foi prometida uma série de graphics novels que, até onde sei, não saíram nem lá fora.

    Voltando para o Brasil: a Pandora Books publicou a primeira série em formato de minissérie em três partes, com duas edições originais em cada edição nacional. Esse material foi republicado no volume 1 encadernado da Panini.

    A Devir lançou os dois encadernados mais adultos da série até então: Inquisição e o Anjo Caído. Estes foram republicados pela Panini com os títulos mudados para Confissão e o Anjo Maculado, respectivamente.

    A Pixel fez edições especiais enfocando personagens antes de pôr a série num mix de Fábulas que só durou quatro edições e apresentou uma história do Caixa de Surpresas. Esse foi o ponto louvável da Pixel: separar as edições por personagens. Assim a história de Astra pôde ser contada sem a advertência “desaconselhável para menores de 18 anos” que acompanha os encadernados da Panini.


    Acontece que Astro City têm personagens para todas as idades e gostos, mas na hora de encadernar, uma ou outra história mais pesada aumenta a classificação etária da edição inteira. Entretanto a Pixel, antigo selo do grupo Ediouro, resolveu não investir na série a longo prazo, abrindo mão de tudo o que era da DC que estava publicando até aquele momento. As revistas da editora traziam material dos selos Vertigo e Wild Storm, lembrando que, na época, Astro City era do selo Ws e Fábulas era do selo Vertigo. As edições da Pixel são memoráveis, mesmo não tendo publicado muito material, eles lançaram o guia turístico de Astro City para apresentar uma gama maior de personagens, bem mais do que a Pandora e a Devir juntas na época.

    A Panini, em sua série de encadernados, republicou tudo o que as editoras anteriores publicaram e foram além. Na época, ela alternava os encadernados entre o material mais antigo e da fase até então mais atual nos EUA, que, até então, era inédita no Brasil. Ao todo a Panini publicou 12 volumes de Astro City. Mesmo não completando a série, é a editora que mais publicou Astro City no Brasil.

    E agora? Agora, não sei. Há o risco real de Astro City prosseguir como uma das muitas séries de quadrinhos inacabadas no Brasil. Ou pior, ser completada em edições de luxo que estrangulem o potencial de formação de publico leitor que a série verdadeiramente tem. Uma vez que tudo no Brasil encareceu e se os quadrinhos simples estão mais caros, os de luxo estão mais caros ainda.

    Como Astro City é uma série de super-heróis autoral, com um só escritor enfocando a história da cidade e só mostrando o que é realmente relevante, ela é uma série de super-heróis sem pré-requisitos, cada encadernado é uma porta de entrada para qualquer leitor que nunca leu nada de super-heróis na vida. Ou seja, é uma série formadora de público. Com efeito, somente as edições 6 e 7 devem ser lidas nessa ordem. Com efeito, Heróis Locais (O volume 5) e a Era das Trevas I e II (os volumes 6 e 7 respectivamente) são ótimas portas de entrada tanto para os super-heróis em geral, quanto para o universo de Astro City especificamente.

    Quase todos os volumes da série (1, 2, 3, 4, 5, 8, 9, 10,11 e 12) trazem histórias completas e fechadas e podem, inclusive, serem lidos fora de ordem. É claro que há riscos de spoilers se você ler fora de ordem, mas o ponto fundamental é que o passado não é pré-requisito para entender as histórias presentes, poucos autores de quadrinhos conseguem fazer isso com super-heróis e ainda manterem uma cronologia; Busiek consegue utilizando o conceito de legado, personagens protagonistas se revezam com o tempo, alguns mantendo as identidades de seus antecessores, outros com identidades próprias, mas os arquétipos passam de geração em geração em legados.

    Restam aos leitores e leitoras que quiserem conhecer este universo o garimpo de gibis em sebos e gibiterias reais ou virtuais. Comprando edições nacionais ou importadas. As principais fontes de informação desse post, além dos encadernados lançados no Brasil são: o verbete em inglês de Astro City na Wikipédia e o site Herocopia, sancionado pelos autores de Astro City. Para um pouco mais sobre Astro City, clique aqui.

Boas leituras e até breve!



2 comentários:

  1. triste! mas bela matéria parabéns muito necessaria

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    1. Obrigado, desculpe a demora. Olhando as redes do Busiek, ele fechou um novo contrato levando tudo para a Image. É uma esperança para nós também que não ficamos dependentes só da Panini. Abraço!

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