Uma coisa tem que ficar bem clara antes do início desta resenha: assim como o filme, o livro pode ser propositalmente mal interpretado por pessoas de má-fé. Laranja Mecânica é uma crítica severa contra a glamorizarão da violência pelos meios de comunicação de massa, sobretudo aos jornais sensacionalistas e aos filmes de aventuras. Laranja Mecânica NÃO É uma apologia à violência. Toda a violência do livro (e do filme) está lá para ser denunciada, NÃO exaltada. Dito isso, podemos continuar.
Originalmente publicado em 1963, Laranja Mecânica foi escrito por Anthony Burgess e é um clássico da ficção científica distópica. Enquanto a Lua está sendo colonizada, a Terra passa por um colapso nas relações legais e sociais. Nesse ambiente, gangues de rua de jovens aterrorizam e pilham os mais velhos enquanto brigam entre si não se importando com quem esteja no fogo cruzado.
Drogas consideradas ilegais são escamoteadas em bebidas a base de leite, isso mesmo, leite, o que potencializa e aumenta a violência dos jovens. A solução encontrada é a lavagem cerebral dos poucos infratores capturados e reincidentes. Mas não seria esse um preço alto demais para se pagar pela segurança? Afinal, a nova tecnologia da laranja mecânica pode remover o livre arbítrio de qualquer pessoa e pode se voltar contra qualquer pessoa.
Vemos a história da perspectiva de Alex em uma narração em primeira pessoa. Ele é um jovem infrator reincidente, sem a menor capacidade de compaixão, ele possui um gosto sofisticado e refinado, é inteligente e o líder de uma das muitas das gangues de rua que ganham dinheiro roubando e extorquindo velhos (sejam eles pedestres, lojistas ou mesmo invadindo casas). Enquanto Alex exerceu sua liderança naturalmente, ela não foi questionada.
Seus aliados se voltam contra ele quando, através de suas críticas às atitudes do Tosko, ele começa a querer formalizar a liderança. Isso ocorre num momento em que Alex volta a chamar a atenção das autoridades, embora não haja provas contra ele e sua gangue, ou assim ele pensa. Capturado, já reincidente, com 15 anos de idade e crimes monstruosos nas costas, Alex é uma cobaia perfeita para a Laranja Mecânica, afinal, se ele for recondicionado, qualquer um poderá ser recondicionado.
Laranja Mecânica é um livro com muitas camadas, algumas perturbadoras: a sociedade é duramente criticada e posta em cheque por essa metáfora futurista. Cultura de massa, educação, niilismo, punição e livre arbítrio são abordados no livro de uma forma bem crua. Alex sabe que é mau, mas não se culpabiliza por isso. Quanto a sociedade descrita no livro, não parece ser tão dura a ponto de justificar as atitudes de Alex e de seus ex-cumplicies, mas está longe de poder ser considerada ideal. Afinal, a punição de Alex é uma lavagem cerebral completa.
Todo o que sabemos, sabemos pelo alhar puco empático e cruel de Alex, que mesmo condicionado não se ilude quanto a própria natureza enquanto questiona a bondade da sociedade que o pune. Não que ele não merecesse ser punido, mas ao menos deveria ser punido como um ser humano. Anthony Burgess, autor do livro, considera que a sociedade não pode ser tão cruel quanto aqueles que se voltam contra ela usando de crueldade. O livro é bom? É, mas não é uma leitura fácil. Pena que a leitura superficial de seu texto seja deveras tentadora, uma vez que o livro levanta questões históricas, filosóficas, antropológicas e sociológicas legítimas; que merecem uma discussão aprofundada que não cabem numa humilde resenha.
Para aqueles que viram o filme antes de ler o livro, a única diferença é que o livro traz cenas a mais. A mensagem é a mesma, a direção de arte do filme recria todos os cenários, tal como o livro os descreve e a narração de Alex reflete o linguajar jovem futurista (em relação a 1963) e que, até hoje, soa como uma nova linguagem. Era a intenção do autor que Alex fosse decifrado a medida em que o leitor lesse o livro, que ele falasse uma língua própria independentemente da época em que o livro fosse lido. Mas não se preocupem, esta edição traz um glossário que o autor não autorizou na época, 1963.
O preço do livro foi R$ 60,00 no estande da editora Aleph no evento Ler, Festival do Leitor 2022. Agora que livro está mais barato que cinema, leia mais livros e assista aos filmes se puder!
Boas Leituras,
Rodrigo Rosas Campos
Um livro pra um dia ler. O filme é bem legal. Todavia imagino que o livro seja bem mais detalhado...
ResponderExcluirVocê fez o comentário sem se logar. Quando der, loga e deixa seu nome. Muito obrigado por comentar!
ExcluirA gente acabou de falar no face, sei quem é você.
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