domingo, 9 de fevereiro de 2025

Garimpando em Gibiterias Especial: Os Primeiros Três Volumes do Gibi de Menininha: Historietas de Terror e Putaria

Desaconselhável para menores de 18 anos.

    O mercado de quadrinhos no Brasil é muito fraco, sejamos honestos. Lá fora, grandes obras permanecem em catálogo permanente tal como livros clássicos. Os editores de quadrinhos nacionais são bem imediatistas e até mesmo obras como Fradim, Watchmen, Piratas do Tietê e Maus ficam difíceis de encontrar de tempos em tempos. A série “Garimpando em Gibiterias” fala de quadrinhos que valem a pena “garimpar” em gibiterias, sebos, estoques antigos de livrarias virtuais, feiras de livros e, se a grana estiver muito curta, em bibliotecas públicas. Sim, existem quadrinhos em bibliotecas públicas, é só procurar.

    As pedras garimpadas de hoje são os três primeiros números da série Gibi de Menininha. Brasil, 2018, treze mulheres, autoras e desenhistas de quadrinhos, se reúnem para levar adiante a tradição de terror escrito por mulheres iniciada por Mary Shelley em Frankenstein, surge o primeiro Gibi de Menininha: Historietas de Terror e Putaria, que apresenta seis histórias em quadrinhos curtas, inéditas e fechadas; escritas, desenhadas e protagonizadas por mulheres. Nem sempre heroínas, nem sempre vilãs, nem sempre vítimas; cada história traz suas próprias surpresas.

    As histórias são curtas, muito curtas, curtíssimas. Falar muito sobre cada uma delas é spoilar, mas vou ao menos dizer os títulos, quem escreveu e quem desenhou. Já adianto que gostei de todas. Cada história é devidamente introduzida por Mama Jellybean, a anfitriã da revista. Vamos as histórias do volume 1.

    Por Eras e Eras te Amarei tem roteiro de Carol Pimentel e arte (e parte do roteiro) de Roberta Cirne. Esta é uma das mais complicadas de não spoilar, portanto nada devo comentar. Desculpem-me, meninas, fica para a próxima.

    Fome, com roteiro de Clarice França e arte de Mari Santtos: um casal vive feliz até que ela é atacada por um vampiro e sobrevive para se tornar uma vampira. Conseguirá ele continuar amando uma mulher cuja natureza mudou para uma predadora de humanos? Conseguirá ela controlar sua fome por amor a ele? Achei o texto dessa história brilhante e terrível.

    Para Sempre (ou um marinheiro que me contou), com roteiro de Germana Viana e arte de Renata C B Lzz: uma boa história de pescadores que não pode ser detalhada sem estragar as surpresas.

    A Última Comitiva, com roteiro de Ana Carolina Recalde Gomes e arte de Talessa Kuguimiya, narra a primeira comitiva de um aprendiz de peão de boiadeiro. O que pode dar errado? Gostei muito das seis histórias, mas, a meu ver, está é a melhor! A harmonia entre texto e arte é incrível, parece que a desenhista criou um estilo só para contar aquela história específica da roteirista. Lembrando, gostei de todas as histórias mas a harmonia entre texto e arte desta é impecável.

    Doce Inocência com roteiro de Milena Azevedo e arte das Senhoritas de Patins, Katia Schittine & Fabiana Signorini: quem pode resistir as receitas deliciosas de um simático velhinho? Qual será o preço desse lanchinho?

    Amarrados, com roteiro de Camila Suzuki e arte de Germana Viana: responda-me, você, que quer amarrar o amor eternamente, qual é o limiar que transforma o paraíso num inferno?

    Uma observação sobre o Gibi de Menininha 1 sé faz necessária: por motivos contratuais, uma das histórias foi substituída na atual reimpressão da edição 1, não sei qual das histórias. Este texto foi feito com base na publicação original de 2018.

    Agora vamos ao Gibi de Menininha 2: O Faroeste É Mais Embaixo: Estava receoso, afinal, são histórias ambientadas no Velho Oeste, EUA, feitas por brasileiras, não ambientadas no nosso quintal, nem no nosso tempo. Histórias feitas no Brasil com temática norte-americana. Já falei que isso me incomodava em uma resenha de outra publicação. Mas as menininhas do gibi tinham MUITO crédito comigo depois do primeiro Gibi de Menininha. Experimentei e elas entregaram, de novo!




    A primeira história é a origem polêmica e picante de nossa querida e amada anfitriã, a Mama Jellybean, com texto e arte de Germana Viana, a mãe da mama! Sim, ela veio da terra do tio San e surgiu no tempo das diligências. Este é, por sinal, o fio condutor das tramas deste novo volume.

    Em seguida vem Sob Nova Direção, escrita por Dani Taranha com desenhos de Sueli Mendes. A melhor e mais surpreendente do gibi! Frank faz muito sucesso com um Saloon para lá de modesto. John é um viciado em jogo que aceita trabalhar para Frank para pagar dívidas. Sem querer, John se vê as voltas com um macabro segredo de Frank. Mais que isso é estragar as surpresas da história.

    Luna de Sangre é uma típica história de vingança no velho oeste? Pode até ser, mas ao partir para sua jornada rumo a vingança, Selina descobrirá que seu pai tinha amigos poderosos que também estão dispostos a se vingar por ele. História escrita por Camila Suzuki e desenhada por Roberta Cirne.

    Monstros de Verdade tem roteiro de Clarice França e desenhos matadores de Renata CB Lzz. Um casal de mocinhas, sim, as heroínas são lésbicas, se vê as voltas com zumbis no velho oeste.

    Delilah, a Rubra: Fabiana Signorini e Kátia Schittine, as Senhoritas de Patins, assinam, de forma conjunta, o texto e a arte dessa história de forma coletiva, ou seja, ambas escreveram e desenharam. Mas vamos a trama; a irmã Mary Clarence deve levar órfãos a um novo orfanato em uma outra cidade, mas a carroça dela e das crianças se atrasa e fica afastada da caravana. Tentando achar a caravana, o grupo se vê as voltas com vozes misteriosas, sons de bandidos que não podem ser vistos e uma nuvem de poeira levantada na estrada sem que o bando de criminosos e seus cavalos possam ser vistos. Conseguirá a irmã levar as crianças em segurança ao novo orfanato na nova cidade?

    Vingança tem roteiro de Rebeca Puig e arte de Germana Viana. Uma daquelas histórias com poucas palavras em que contar muito é dar spoiler. Você quer spoiler? Foi o que pensei.

    Mato a Cobra e Mostro o Pau, com roteiro de Milena Azevedo e arte de Juliana Loyola, fala de uma índia, sobrevivente de uma tribo dizimada, que se une a um comerciante picareta para recuperar o ouro que os brancos pilharam da terra de seus ancestrais. Mal sabe o picareta de todas as intenções de sua parceira nativa.

    Como já disse, torço o nariz para histórias ambientadas fora do país dos escritores e desenhistas, nem gosto de Tex e companhia, me julguem! Mas as menininhas do gibi me surpreenderam, colocando o erotismo (e a putaria) típico(s) do terror brasileiro no tempero do oeste norte-americano. Gibi de Menininha 2 tem tudo para agradar a: quem gosta de terror; quem gosta de putaria; quem gosta de velho oeste; e quem gosta de quadrinhos tudo junto e misturado! As histórias são inéditas e completas, ou seja, perfeitas para leitores casuais.

    O terceiro Gibi de Menininha é Contos de Fodas, com fadas bem safadas e fatais. Bom, acho que algumas pessoas podem ainda não saber, mas os contos de fadas em sua origem eram contos de terror, feitos para aterrorizar crianças mesmo. Mas as fadas das menininhas do gibi não são apenas aterrorizantes, são muito, muito, mas muito safadinhas também! Cada história é devidamente introduzida - ui - por Mama Jellybean, a anfitriã da revista, as voltas com um príncipe que a tomou como princesa. Vamos às histórias:

    Como seria a história dos Três Porquinhos no mundo de hoje? É o que o roteiro de Dani Taranha e a arte de Roberta Cirne nos revelam.

    Caça e Caçadora, traz roteiro de Milena Azevedo e arte de Germana Viana. Uma humana e um anão são famosos caçadores de dragões e partem para ver por que há um dragão tão nervoso nas imediações da vila.

    Regente das Fadas é das Senhoritas de Patins; roteiro e arte de Kátia Schittine e arte-final de Fabiana Signorine. Numa vila que está queimando bruxas, um casal foge para tentar achar o portal do mundo das fadas e, talvez, libertar a rainha das fadas contra uma cruel inquisição. Será que eles conseguirão? Achei essa a melhor da edição 3.

    Abissal com roteiro de Camila Suzuki e arte de Renata CB LZZ traz a história de uma garota que estuda biologia marinha por sua grande atração pelo mar numa expedição onde ela descobrirá que certas lendas do oceano são reais. Teria ela algo de sobrenatural para escapar ao canto de sereias?

    Semente, com roteiro de Renata CB LZZ e arte de Mari Santtos traz uma convenção de quadrinhos e estranhos bombons. O que pode ser tão aterrador nesse contexto? Descubra lendo o texto.

    Seremos os Vilões, com roteiro de Clarice França e arte de Germana Viana, é a história de dois elfos que lutam na guarda de uma vila que não os aceitam. Até que um deles foge para o nosso mundo e os dois se encontram em São Paulo.

    Em todas estas histórias temos personagens brilhantemente desenvolvidos em tramas que misturam erotismo e terror nas medidas exatas. Seres sobrenaturais não podem ser reduzidos a um conjunto de poderes, eles precisam de alma humana, pois refletem os lados mais monstruosos da humanidade. Estas escritoras e desenhistas de terror se lembram muito bem disso. Prepare-se para se encantar e se amedrontar com essas histórias de terror, terror & oeste e terror & fadas safadas, todas com muita putaria.

    Para quem curte detalhes técnicos como narrativa gráfica, todas as tramas desses gibis são aulas de como fazer desenhos narrarem um texto com dinâmicas diferentes de acordo com a organização dos quadros e a diagramação de cada página. Cada uma destas seis histórias é uma aula prática da chamada narrativa gráfica e de como em espaços iguais pode-se conseguir dinâmicas diferentes. Cada história tem sua própria voz e seu próprio ritmo.

    Quebrando estereótipos e mostrando que mulheres também criam histórias aterrorizantes, Gibi de Menininha retoma duas tradições esquecidas nos quadrinhos nacionais: a tradição do terror e a tradição da putaria. Lembrando que terror e putaria foram hegemônicos em nossas bancas até meados dos anos 1980. O talento destas mulheres é inquestionável, Gibi de Menininha merece estar nas melhores prateleiras de leitores de terror, de quadrinhos e de quadrinhos de terror do mundo. Que venham mais Gibis de Menininhas no futuro e eu espero um pouco mais de putaria, a vida real já está aterrorizante demais!

    As edições ainda trazem pequenas biografias e bibliografias das autoras, mas, para os leitores e leitoras que quiserem mais, todas as autoras possuem sites com quadrinhos na Internet, só dar um Google, confiram! Elas também estão em todas as redes sociais

    Boas leituras e, se puder, boa noite e bons sonhos! Huahahahahahahaha!


    Rodrigo Rosas Campos


    P.S.: espero que essa iniciativa das menininhas inspire a Mythos a publicar os arquivos completos da Vampirella ou, pelo menos, o primeiro volume. Muitas das histórias que Vampirella narrou são tão boas ou melhores que a sua própria.

    Além do mais, o publico brasileiro gosta e aprova revistas temáticas com histórias que não possuem elenco fixo. O Gibi de Menininha é uma excelente prova disso. Histórias curtas e fechadas de terror, cada uma com seu próprio elenco de personagens, todas independentes entre si, cada uma por uma equipe criativa diferente, isso forma leitores e estas 3 edições foram financiadas pelo público que lê.

    Também espero que os editores olhem para os talentos de nosso próprio quintal, enfim não entendo o porquê dos editores de modo geral não olharem para iniciativas como essa!

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