domingo, 17 de abril de 2022

Garimpando Em Gibiterias: As Fúrias Femininas de Cecil Castelucci e Adriana Melo


 Para maiores de 18 anos (em idade mental também)!

    O mercado de quadrinhos no Brasil é muito fraco, sejamos honestos. Lá fora, grandes obras permanecem em catálogo permanente tal como livros clássicos. Os editores de quadrinhos nacionais são bem imediatistas e até mesmo obras como Fradim, Watchmen, Piratas do Tietê e Maus ficam difíceis de encontrar de tempos em tempos. A série “Garimpando em Gibiterias” fala de quadrinhos que valem a pena “garimpar” em gibiterias, sebos, estoques antigos de livrarias virtuais, feiras de livros e, se a grana estiver muito curta, em bibliotecas públicas. Sim, existem quadrinhos em bibliotecas públicas, é só procurar.

    Não escrevo muito sobre a DC e a Marvel. Já tem gente demais falando sobre “as duas grandes” e, na maioria das vezes, nem é pelos quadrinhos. Mas a pedra garimpada de hoje é As Fúrias Femininas com textos de Cecil Castelucci e desenhos de Adriana Melo, sim, ela é do Brasil. Juntas, as autoras dão uma visão feminina das personagens femininas mais emblemáticas de Jack Kirby em seu Quarto Mundo. Mas vamos com calma.

    Antes de mais nada, o(a) leitor(a) não é obrigado a ter nenhuma leitura prévia para entender As Fúrias Femininas. É uma história completa e autocontida de verdade, pode confiar. Publicada originalmente nos EUA em uma minissérie em 6 edições da DC Comics em 2019, ela chegou ao Brasil pela Panini em um encadernado único, formato americano e capa dura em 2021.

    Foi caro na época, talvez ainda esteja um pouco salgado, mas vale muito a pena. E sim, esse quadrinho tem política, como tudo que é feito dentro de uma sociedade de seres humanos seja lá o que for. Tirado esse elefante da sala, quem não quiser continuar que vá embora, vamos continuar.

    A história se passa no planeta Apokolips em sua eterna guerra com o planeta vizinho e irmão Nova Gênese. Apokolips é governada pelo tirânico Darkseid. Acompanhamos a história pelos olhos de Vovó Bondade e seu time de guerreiras de elite, as Fúrias Femininas.

    Uma tropa de guerra de elite só de mulheres, elas devem ser muito respeitadas e temidas pelos seus pares, não é? Infelizmente, não. Assim como em nosso planeta e em nossa realidade, as Fúrias sofrem todos os tipos de abusos por seus pares e superiores masculinos. Precisam se esforçar muito por reconhecimentos pífios e sofrem todos os tipos de abusos cometidos contra todas as mulheres em uma sociedade patriarcal.

    Não pensem os leitores que a tirania de Apokolips só é uma ameaça para Nova Gênese e outros planetas, como a Terra, inclusive. As fúrias femininas também sofrem com a tirania absolutista de Darkseid ao mesmo tempo que são instrumentos dessa mesma tirania contra o restante da população oprimida de Apokolips.

    Mas entre as fúrias está Auralie, que grita abertamente contra os abusos de seus superiores masculinos e cujo exemplo pode mudar a postura das demais, e a Grande Barda, que se apaixona por um Neo Genesiano. Serão estes exemplos suficientes para que as fúrias comecem uma revolução total em Apokolips contra Darkseid e o patriarcado opressivo que ele representa? Responder isso agora, seria dar spoilers.

    Como já foi dito, há momentos pesados na revista, ela não é aconselhada a menores de 18 anos. Talvez possa ser lida por adolescentes, mas só pelos(as) mais maduros(as). Não acompanho DC mensalmente há muito tempo. Li essa edição sem saber se ela é o cânone do universo DC do Renascimento ou se ela era uma realidade 100% alternativa. Mas isso não importa de verdade; As Fúrias Femininas é uma obra brilhante que trata de questões delicadas e sérias usando a ficção científica e o universo de Jack Kirby na DC com uma maestria ímpar e de forma impecável.

    Para os que leram o Quarto Mundo de Jack Kirby, As Fúrias Femininas de Cecil Castelucci e Adriana Melo traz uma releitura completa, ou seja, não espere fidelidade aos acontecimentos e previsões da obra original. As ideias de Jack Kirby foram respeitadas, mas as autoras concluem a obra inacabada do rei do jeito delas. Basicamente, é uma visão de um Quarto Mundo alternativo. Uma alternativa que só foi possível graças ao brilhante olhar feminino de suas autoras.

    Na minha cronologia pessoal, As Fúrias Femininas são um universo paralelo a partir da história publicada originalmente nos EUA em Mister Miracle #8 de 1972 (volume 6 da Panini). As Fúrias Femininas é uma obra tão válida quanto a obra original, pois as ideias de Kirby sobre Darkseid e o nazismo que o personagem representa estão lá.

    Se você é um purista chato ou um misógino machista fingindo ser purista chato, ficção não é religião, quer cânone, vá a uma igreja. Deixe seus comentários com carinho e educação, pois eles serão lidos com carinho e educação.

    E só para lembrar, a DC não permitiu que Kirby concluísse a sua obra, o Quarto Mundo ficou inacabado em meio a uma ponta solta que poderia ser livremente interpretada e amarrada pelos futuros profissionais contratados da DC. Cânone ou não, seja de que universo for, Cecil Castelucci e Adriana Melo realizaram uma produção oficial da DC. As duas melhores editoras da DC de todos os tempos foram mulheres. Se você é um machista sem talento que reclama por puro preconceito, receba!

    Este garimpo tem periodicidade indefinida, mas, se você quer conhecer mais, na área de pesquisa deste blog, digite “Garimpando em Gibiterias” e clique no botão “Pesquisar”. Ou digite apenas “garimpando” e encontrará títulos a mais em garimpos de eventos. Faça a mesma coisa no site Literakaos.


    Boas leituras!

    Rodrigo Rosas Campos

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